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terça-feira, 18 de novembro de 2008

Previdência Pública x Interesses liberais



Pra quem ainda não percebeu, disponibilizei o link para o blog Óleo do Diabo, de Miguel do Rosário já algum tempo. Atento as informações e um exímio escritor, tem propiciado sérias reflexões a respeito de diversos temas.

O texto abaixo não é dele, mas está disponibilizado em seu blog. Aborda inteligentemente as incoerências do pensamento liberal em relação a Previdência Pública.

Vale a pena a leitura.

Por João Villaverde


Alguns temas são sempre polêmicos. Previdência pública é um deles. Vou dar um exemplo da mais nova discussão que acontece no mundo político e midiático sobre a Previdência. No Brasil, o sistema de concessão de benefícios previdenciários já mudou diversas vezes. Foi "adaptado pela modernidade", diria o discurso liberal. Durante os anos 90, dentre as várias reformas passadas pelo governo FHC, a reforma da Previdência alterou o pagamento de aposentadorias e pensões.O discurso liberal era de que o governo tinha de dar lucro. E como Previdência no Brasil é algo novo, pagamos mais benefícios do que recebemos contribuições. Ou seja, déficit sempre.


Como resolver, segundo os liberais? Diminuindo o valor dos benefícios pagos a fim de fazer caber. Parece complicado? Trago então para a realidade social. Pegue um aposentado. Ele se aposentou antes dessas mudanças. De acordo com suas contribuições ao INSS, na data da concessão - após se aposentar - seu benefício equivalia a três salários mínimos. Com todas as mudanças salariais ocorridas nesse espaço de tempo, hoje aquele valor equivale a um salário mínimo.


Agora para a realidade política. O senador Paulo Paim (PT-RS) desenvolveu um projeto que devolve a esse aposentado o valor dos dois salários mínimos. Como fez isso? O valor correspondente aos dois salários mínimos no nosso exemplo será dividido em cinco parcelas, pagas a cada ano. No final de cinco anos, o poder de compra estará restabelecido. Dessa forma, a equiparação é diluída no tempo, não atrapalhando a política de gastos do INSS.


O projeto do Paim foi aprovado na noite da quarta-feira 12/11 pelo Senado. Vai agora à Câmara de Deputados. Se aprovado lá, vira lei. Virou nota nos jornais. Na quinta-feira passada O Globo deu manchete: "Senado sobe aposentadorias e rombo pode ser de R$ 9 bi; Projeto segue votação na Câmara, onde governo tentará barrá-lo". A leitura que o jornal faz é aquela velha cantilena liberal, de que aumento de gastos com Previdência não é política social, mas rombo. Ao situar que o governo tentará barrar a idéia, não só o jornal demonstra um raquitismo social do governo - se este de fato quiser barrar - mas também coloca uma pressãozinha para que o projeto não passe. A edição de hoje do Globo já traz a afirmação tão querida do Paulo Bernardo, ministro do Planejamento, de que o governo barrará a aprovação das medidas de aumento dos benefícios.


É justo isso? Quer dizer, faz-se uma gritaria danada por um aumento de R$ 9 bilhões anual. Sabe quanto o mesmo governo gasta com juros da dívida, todo ano? Algo como R$ 120 bilhões. Se é para cortar gasto público, porque não começar por uma conta que beneficia poucas famílias com muito ao invés de outra que beneficia muitos com pouco?


No dia seguinte, sexta, O Globo faz o super esperado: escreve um editorial sobre o tema. Com título de "Estapafúrdio", o editorial do jornal afirma que a aprovação pelo Senado do projeto de Paim "não só é estapafúrdia pelo momento que o mundo vive, com a ameaça de uma grave crise, cujo fim ninguém hoje é capaz de enxergar, mas também pelo critério em si, que tenta transferir para os aposentados os ganhos de rendimentos que não tiveram durante sua vida laboral". Em épocas de crise, quando os investimentos privados são suspensos - pela incerteza do lucro - e os bancos emprestam menos - pelo medo de inadimplência - apenas o governo tem disposição de investir. Isso é lógico e comprovável historicamente. Ao aumentar o dinheiro nas mãos dos aposentados, que consomem quase a totalidade do que recebem o governo, não está apenas transferindo renda, mas também movimentando o comércio de bens e serviços, movimentando a economia. É política anti-crise.


Além disso, essa de ficar dizendo ser injusto "transferir aos aposentados ganhos que não tiveram em sua vida laboral" é ser altamente esnobe e individualista. Parte do pressuposto que todos os aposentados tiveram a boa vida que o editorialista d'O Globo teve. Como os assuntos são os mesmos e a opinião também, o projeto de Paim alcançou o Estadão de ontem. Em editorial ("Mais gastos da Previdência"), o jornal clama que "desde que chegou ao Congresso, como deputado, o agora senador petista não faz outra coisa senão propor aumentos do salário mínimo e dos benefícios previdenciários". Que coisa ruim, não?


Quer dizer, aumentar o superávit primário pode, mas aumentar a previdência não, certo?


Fôssemos uma sociedade mais ativa, esse tipo de abuso da imprensa não passaria com a facilidade que passa. E não adianta pensar que a opinião dos jornalões não tem mais o peso que tinham antes. Podem ter perdido um bocado do prestígio, mas mantém a única influência que importa no nosso país: a dos legisladores. São estes, os representantes dos esfomeados, que são influenciados pela opinião dos jornais.

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